Destinação

Era uma quarta-feira chuvosa e fria quando entrei em um bar a dois quarteirões do meu apartamento. Havia andado sem rumo até ali, como se os meus pés me conduzissem até aquela porta.

Assim que entrei examinei o ambiente. Algumas mesas, iluminação baixa, um jukebox antigo encostado na parede nos fundos e o local praticamente vazio. Sentei-me em uma banqueta alta e apoiei os cotovelos no balcão, até que o barman perguntou o que eu iria beber.

– Tanqueray e tônica, uma dose no copo largo, por favor!

Enquanto ele preparava minha bebida, meus pensamentos se perderam em meio a acontecimentos passados. Levei um susto quando uma voz rouca me tirou de meus devaneios, olhei para o lado e vi um moço, sentado a duas banquetas de distância, fazendo seu pedido. Quando percebeu que eu estava encarando-lhe, abriu um meio sorriso e eu me virei no mesmo instante.

Assim que minha bebida foi entregue fiquei encarando-a por alguns minutos, até que olhei para o lado e vi o desconhecido absorto em seus pensamentos enquanto passava o polegar sobre a borda do copo. Sem que ele percebesse comecei a examiná-lo dos pés a cabeça, tentando entender o que um moço tão bonito vinha fazer em um bar de quinta como este.

Observei seus cachos castanhos que caiam sobre sua testa, seu maxilar contraído, a camiseta jeans que contornava perfeitamente os músculos e as tatuagens que transcorriam pelos braços. Enquanto tentava decifrar os desenhos ele virou-se depressa para mim, o que me fez levantar o olhar e esquadinhar cada detalhe do seu rosto. Os olhos pretos mais intensos que eu já havia visto, a pequena cicatriz na sobrancelha esquerda e assim que comecei a examinar minuciosamente o desenho perfeito de sua boca, ele curvou os lábios num sorriso travesso e minhas bochechas coraram, forçando-me a desviar a atenção para o barman.

Olhei de soslaio quando ele levantou-se e caminhou em direção ao jukebox. Colocou uma música lenta e começou a andar rumo ao seu lugar. Concentrei-me novamente no meu copo e fui surpreendida por uma mão que se estendeu a minha frente. Olhei para cima e me deparei com um belo sorriso convidativo, sem dizer nem uma única palavra, agarrei sua mão e ele me encaminhou até o centro do bar.

Senti um calor subir pela minha espinha quando ele posicionou suas mãos sobre a minha cintura. Coloquei meus braços sobre seu pescoço, ele me puxou para mais perto de si, colando nossos corpos, e começou a conduzir a dança.

Minha mente dizia que eu não deveria ter introduzido aquele contato, pois não havíamos trocado uma palavra sequer. No instante que senti seu coração pulsar no mesmo ritmo que o meu, silenciei meus pensamentos e encostei minha cabeça na dele, podendo ouvir sua respiração ofegante. Quando a música finalizou, soltei um longo suspiro, mas fui surpreendida por um abraço caloroso que durou longos segundos. Nos distanciamos e o encarei, até que ele abriu um sorriso tímido e acenou para que fossemos nos sentar novamente.

Passamos boa parte da noite contando o que havia nos levado até aquele lugar e nos demos conta que os nossos motivos eram os mesmos. Ele me contou sobre seu gosto peculiar por jogos de cruzadinha e eu lhe contei sobre minha paixão por piano.


Depois de muitas risadas e confidências trocadas, tive a plena certeza que os pedaços do meu coração poderiam ser remontados e que ele ainda poderia bater impetuoso novamente.

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